N° de questões: 180
Querido diário
Hoje topei com alguns conhecidos meus
Me dão bom-dia, cheios de carinho
Dizem para eu ter muita luz, ficar com Deus
Eles têm pena de eu viver sozinho
[...]
Hoje o inimigo veio me espreitar
Armou tocaia lá na curva do rio
Trouxe um porrete a mó de me quebrar
Mas eu não quebro porque sou macio, viu
HOLANDA, C. B. Chico. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2013 (fragmento).
Uma característica do gênero diário que aparece na letra da canção de Chico Buarque é o(a)
Galinha cega
O dono correu atrás de sua branquinha, agarrou-a, lhe examinou os olhos. Estavam direitinhos, graças a Deus, e muito pretos. Soltou-a no terreiro e lhe atirou mais milho. A galinha continuou a bicar o chão desorientada. Atirou ainda mais, com paciência, até que ela se fartasse. Mas não conseguiu com o gasto de milho, de que as outras se aproveitaram, atinar com a origem daquela desorientação. Que é que seria aquilo, meu Deus do céu? Se fosse efeito de uma pedrada na cabeça e se soubesse quem havia mandado a pedra, algum moleque da vizinhança, aí... Nem por sombra imaginou que era a cegueira irremediável que principiava.
Também a galinha, coitada, não compreendia nada, absolutamente nada daquilo. Por que não vinham mais os dias luminosos em que procurava a sombra das pitangueiras? Sentia ainda o calor do sol, mas tudo quase sempre tão escuro. Quase que já não sabia onde é que estava a luz, onde é que estava a sombra.
GUIMARAENS, J. A. Contos e novelas. Rio de Janeiro: Imago, 1976 (fragmento).
Sem acessórios nem som
Escrever só para me livrar
de escrever.
Escrever sem ver, com riscos
sentindo falta dos acompanhamentos
com as mesmas lesmas
e figuras sem força de expressão.
Mas tudo desafina:
o pensamento pesa
tanto quanto o corpo
enquanto corto os conectivos
corto as palavras rentes
com tesoura de jardim
cega e bruta
com facão de mato.
Mas a marca deste corte
tem que ficar
nas palavras que sobraram.
Qualquer coisa do que desapareceu
continuou nas margens, nos talos
no atalho aberto a talhe de foice
no caminho de rato.
Nesse texto, a reflexão sobre o processo criativo aponta para uma concepção de atividade poética que põe em evidência o(a)
A origem da obra de arte (2002) é uma instalação seminal na obra de Marilá Dardot. Apresentada originalmente em sua primeira exposição individual, no Museu de Arte da Pampulha, em Belo Horizonte, a obra constitui um convite para a interação do espectador, instigado a compor palavras e sentenças e a distribuí-las pelo campo. Cada letra tem o feitio de um vaso de cerâmica (ou será o contrário?) e, à disposição do espectador, encontram-se utensílios de plantio, terra e sementes. Para abrigar a obra e servir de ponto de partida para a criação dos textos, foi construído um pequeno galpão, evocando uma estufa ou um ateliê de jardinagem. As 1 500 letras-vaso foram produzidas pela cerâmica que funciona no Instituto Inhotim, em Minas Gerais, num processo que durou vários meses e contou com a participação de dezenas de mulheres das comunidades do entorno. Plantar palavras, semear ideias é o que nos propõe o trabalho. No contexto de Inhotim, onde natureza e arte dialogam de maneira privilegiada, esta proposição se torna, de certa maneira, mais perto da possibilidade.
Disponível em: www.inhotim.org.br. Acesso em: 22 maio 2013 (adaptado).
O nome do inseto pirilampo (vaga-lume) tem uma interessante certidão de nascimento. De repente, no fim do século XVII, os poetas de Lisboa repararam que não podiam cantar o inseto luminoso, apesar de ele ser um manancial de metáforas, pois possuía um nome “indecoroso” que não podia ser “usado em papéis sérios”: caga-lume. Foi então que o dicionarista Raphael Bluteau inventou a nova palavra, pirilampo, a partir do grego pyr, significando 'fogo’, e lampas, 'candeia’.
O texto descreve a mudança ocorrida na nomeação do inseto, por questões de tabu linguístico. Esse tabu diz respeito à
Primeira lição
Os gêneros de poesia são: lírico, satírico, didático, épico, ligeiro.
O gênero lírico compreende o lirismo.
Lirismo é a tradução de um sentimento subjetivo, sincero e pessoal.
É a linguagem do coração, do amor.
O lirismo é assim denominado porque em outros tempos os versos sentimentais eram declamados ao som da lira.
O lirismo pode ser:
a) Elegíaco, quando trata de assuntos tristes, quase sempre a morte.
b) Bucólico, quando versa sobre assuntos campestres.
c) Erótico, quando versa sobre o amor.
O lirismo elegíaco compreende a elegia, a nênia, a endecha, o epitáfio e o epicédio.
Elegia é uma poesia que trata de assuntos tristes.
Nênia é uma poesia em homenagem a uma pessoa morta.
Era declamada junto à fogueira onde o cadáver era incinerado.
Endecha é uma poesia que revela as dores do coração.
Epitáfio é um pequeno verso gravado em pedras tumulares.
Epicédio é uma poesia onde o poeta relata a vida de uma pessoa morta.
CESAR, A. C. Poética. São Paulo: Companhia das Letras, 2013.
No poema de Ana Cristina Cesar, a relação entre as definições apresentadas e o processo de construção do texto indica que o(a)
Você pode não acreditar
Você pode não acreditar: mas houve um tempo em
que os leiteiros deixavam as garrafinhas de leite do lado
de fora das casas, seja ao pé da porta, seja na janela.
A gente ia de uniforme azul e branco para o grupo,
de manhãzinha, passava pelas casas e não ocorria que
alguém pudesse roubar aquilo.
Você pode não acreditar: mas houve um tempo em
que os padeiros deixavam o pão na soleira da porta ou na
janela que dava para a rua. A gente passava e via aquilo
como uma coisa normal.
Você pode não acreditar: mas houve um tempo em
que você saía à noite para namorar e voltava andando
pelas ruas da cidade, caminhando displicentemente,
sentindo cheiro de jasmim e de alecrim, sem olhar para
trás, sem temer as sombras.
Você pode não acreditar: houve um tempo em que as
pessoas se visitavam airosamente. Chegavam no meio da
tarde ou à noite, contavam casos, tomavam café, falavam
da saúde, tricotavam sobre a vida alheia e voltavam de
bonde às suas casas.
Você pode não acreditar: mas houve um tempo
em que o namorado primeiro ficava andando com a
moça numa rua perto da casa dela, depois passava a
namorar no portão, depois tinha ingresso na sala da
família. Era sinal de que já estava praticamente noivo
e seguro.
Houve um tempo em que havia tempo.
Houve um tempo.
SANT’ANNA, A. R. Estado de Minas, 5 maio 2013 (fragmento).
O livro A fórmula secreta conta a história de um episódio fundamental para o nascimento da matemática moderna e retrata uma das disputas mais virulentas ciência renascentista. Fórmulas misteriosas, duelos públicos, traições, genialidade, ambição — e matemática! Esse é o instigante universo apresentado no livro, que resgata a história dos italianos Tartaglia e Cardano e da fórmula revolucionária para resolução de equações de terceiro grau. A obra reconstitui um episódio polêmico que marca, para muitos, o início do período moderno da
matemática.
Em última análise, A fórmula secreta apresenta-se
como uma ótima opção para conhecer um pouco mais
sobre a história da matemática e acompanhar um dos
debates científicos mais inflamados do século XVI no
campo. Mais do que isso, é uma obra de fácil leitura e
uma boa mostra de que é possível abordar temas como
álgebra de forma interessante, inteligente e acessível ao
grande público.
A partida de trem
Marcava seis horas da manhã. Angela Pralini pagou
o táxi e pegou sua pequena valise. Dona Maria Rita de
Alvarenga Chagas Souza Melo desceu do Opala da
filha e encaminharam-se para os trilhos. A velha bem-vestida
e com joias. Das rugas que a disfarçavam saía
a forma pura de um nariz perdido na idade, e de uma
boca que outrora devia ter sido cheia e sensível. Mas
que importa? Chega-se a um certo ponto — e o que foi
não importa. Começa uma nova raça. Uma velha não
pode comunicar-se. Recebeu o beijo gelado de sua filha
que foi embora antes do trem partir. Ajudara-a antes a
subir no vagão. Sem que neste houvesse um centro, ela
se colocara do lado. Quando a locomotiva se pôs em
movimento, surpreendeu-se um pouco: não esperava
que o trem seguisse nessa direção e sentara-se de
costas para o caminho.
Angela Pralini percebeu-lhe o movimento e perguntou:
— A senhora deseja trocar de lugar comigo?
Dona Maria Rita se espantou com a delicadeza,
disse que não, obrigada, para ela dava no mesmo.
Mas parecia ter-se perturbado. Passou a mão sobre o camafeu filigranado de ouro, espetado no peito, passou
a mão pelo broche. Seca. Ofendida? Perguntou afinal a
Angela Pralini:
— É por causa de mim que a senhorita deseja trocar
de lugar?
Esses chopes dourados
[...]
quando a geração de meu pai
batia na minha
a minha achava que era normal
que a geração de cima
só podia educar a de baixo
batendo
quando a minha geração batia na de vocês
ainda não sabia que estava errado
mas a geração de vocês já sabia
e cresceu odiando a geração de cima
aí chegou esta hora
em que todas as gerações já sabem de tudo
e é péssimo
ter pertencido à geração do meio
tendo errado quando apanhou da de cima
e errado quando bateu na de baixo
e sabendo que apesar de amaldiçoados
éramos todos inocentes.
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